10 de outubro de 2016

COM COMBONI: PASTORES BONS E BELOS


A Igreja confiou aos combonianos uma parte do selfie de Jesus-pastor bom e belo para celebrarmos a solenidade de São Daniel Comboni, nosso pai e fundador.

Este texto faz parte do património espiritual que Daniel Comboni nos legou. Na relação à Sociedade de Colónia, a 15 de fevereiro de 1879, escreveu: «O Sagrado Coração de Jesus palpitou também pelos povos negros da África Central e Jesus Cristo morreu igualmente pelos Africanos. Jesus Cristo, o Bom Pastor, acolherá também a África Central dentro do seu redil» (Escritos 5647).

Neste parágrafo Comboni junta dois ícones cristológicos que combina num só: o Sagrado Coração de Jesus e Jesus Cristo, o Bom Pastor, de que resulta a mística comboniana do Bom Pastor do Coração Trespassado. A Regra de Vida 3.1 indica que se trata de «uma preciosa herança este aspeto relevante do carisma do Fundador», um património a conservar, aprofundar e inculturar.

Na Carta Circular aos participantes no Concílio Vaticano I, a 24 de junho de 1870, Comboni escreveu: «É preciso, pois, fazer todo o esforço para que a Nigrícia se una à Igreja Católica. Pedem-no a honra e a glória de N. S. Jesus Cristo, a cujo império ainda se não submeteu a África Central, depois de tanto tempo e apesar de Ele ter derramado o seu sangue para a sua regeneração. Exige-o a promessa feita por Nosso Senhor à Santa Madre Igreja: “Haverá um só rebanho sob um só pastor” (Jo.10)» (Escritos, 2308).

Para Comboni, Jesus é o «eterno e sumo Pastor» (Escritos, 3780). Chamou Obra do Bom Pastor ao grupo que fundou para apoiar a missão da África Central e Anais do Bom Pastor ao órgão de informação ao serviço da missão, publicado ainda hoje com o título de Nigrizia.

Volvamos o olhar do nosso coração para o ícone que a Igreja nos confia para celebrarmos a solenidade do fundador (João 10, 11-16).

Jesus revela-se como o pastor que é καλός – bom e belo – e põe a vida para a ovelhas ou como diz a tradução portuguesa «dá a vida pelas suas ovelhas».

A mística do Bom e Belo Pastor do Coração Trespassado tem algumas consequências práticas para os discípulos missionários.

Comboni escreveu na quarta edição do Plano para a regeneração da África: «À imitação do Divino Pastor, [os apóstolos] tomarão, dos espinhos em que se encontravam e da opressão em que jaziam, aquelas míseras ovelhas sobre os seus ombros para as levar em triunfo às livres e férteis pastagens da Igreja» (Escritos 2791).

Mais tarde, escreve na Relação histórica e estado do Vicariato da África Central à Sociedade de Colónia em 1877 em ligação com o Islão: «O missionário mergulhado em profunda oração, no meio destas solidões incomensuráveis, julga ouvir a voz do Divino Pastor que busca a ovelha negra perdida» (Escritos 4949).

É uma mística que nos abre a Deus e ao seu povo, a toda a criação.

Jesus compara o pastor com o mercenário: o pastor dá a vida, o mercenário foge para salvar a própria pele do lobo que «arrebata e dispersa» as ovelhas. As ovelhas são do pastor, o mercenário não se preocupa com elas: é um assalariado.

Para dar a vida temos que ser plenamente viventes, completamente vivos. Santo Ireneu de Lião escreveu que «a glória de Deus é o homem vivo e a vida do homem consiste na visão de Deus».

Os Documentos Capitulares 2015 sublinham o preço do pastoreio recordado na vida dos nossos 25 mártires, missionárias e missionários: «para defender a vida das ovelhas temos de enfrentar lobos e ladrões» (DC’ 15, 4).

Comboni já o houvera dito: «O missionário apostólico não pode percorrer senão o caminho da cruz do divino Mestre, semeada de espinhos e fadigas de todo o género. […] Portanto, o verdadeiro apóstolo não deve ter medo de nenhuma dificuldade, nem sequer da morte. A cruz e o martírio são o seu triunfo» (Escritos 5647).

Jesus passa depois para a descrição da relação com o seu rebanho: «conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-me, do mesmo modo que o Pai me conhece e Eu conheço o Pai».

Jesus fala de um conhecimento que ultrapassa a mera acumulação de informação. Trata-se de um conhecimento cordial que é relação, intimidade, comunhão pessoal.

Antoine de Saint-Exupéry escreve em O Principezinho que «só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.»

Voltamos de novos aos documentos do Capítulo: «Característica do discípulo é o encontro pessoal com o Bom Pastor e a escuta da sua voz, saboreando o seu amor e caminhando atrás d’Ele (João 10, 1-21)» (DC’ 15, 2).

Mais à frente lemos: «É necessário manter os olhos fixos em Jesus Cristo que nos introduz na contemplação do mistério de Deus, mas também no mistério do homem, onde o encontramos presente na sua riqueza e diversidade» (DC’ 15, 28).

A relação única, pessoal e comunitária que temos com a Trindade Santíssima é o conhecimento que somos chamados a partilhar no serviço missionário que vamos desenvolver – para não sermos nem mercenários nem vendedores de uma ideologia cristã.

Os capitulares escreveram-nos: «Queremos viver uma relação de comunhão com Deus e partilhá-lo com quem está ao nosso lado» (DC’ 15, 29).

Finalmente, Jesus diz que precisa de reunir outras ovelhas! O discípulo missionário tem que estar disponível para partir para outros rebanhos em estado de missão permanente: o mundo é o seu espaço e o seu limite. A grande tentação é transformar a tenda de pastor em morada do guardador.

A Palavra de Deus é para todos e é uma palavra que congrega: «elas ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só pastor».

Daí o desafio do Capítulo: «Jesus chama-nos a viver e a promover vida plena para todos, conscientes de que trabalhamos num mundo em que forças poderosas levam por diante um plano de morte e destruição» (DC’ 15, 2).

O Pastor Bom e Belo ensina-nos a dar a vida e para isso dá-nos a vida em plenitude (João 10, 10). Um ícone que inspirou Comboni e nos desafia: tendo os olhos fixos em Jesus somos chamados a ser pastores segundo o coração de Deus, inteligentes e sabedores (Jeremias 3,15) na senda do nosso fundador.

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